A PARTÍCULA
DE DEUS E NÓS
Marcelo
Barros
Monge Beneditino e Escritor
Deu nos jornais: os cientistas
descobriram e isolaram "a partícula de Deus”. Muita gente se pergunta se
se trata de alguma prova concreta da existência do Espírito Divino. Outros, com
mais malícia, desconfiam que a ciência tenha conseguido captar Deus em seus
laboratórios e os segredos divinos são agora posse da ciência.
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e
fato, físicos da Organização Européia para a Pesquisa Nuclear (CERN), centro
internacional de física na Suíça, anunciaram a descoberta do bóson de Higgs,
partícula subatômica que eles procuravam há décadas e agora parecem ter
encontrado. Chama-se de Higgs, em homenagem a Peter Higgs que, em 1964, tinha
vislumbrado a sua existência e posto a ciência à sua busca. Tantos anos depois,
no acelerador de partículas do CERN, a maior máquina já criada na história da
humanidade, ao provocar trilhões de colisões de prótons em uma velocidade
espantosa, os programas de computador analisam as partículas que se desintegram
da massa. Assim, descobriram o que pode ser o bóson de Higgs. O apelido de
"partícula de Deus” vem duma coincidência e de uma estratégia comercial.
Com todas as dificuldades e mistérios que a cercam, um dos cientistas que
escreveu sobre ela, a chamou, em inglês, "a maldita partícula de Deus”.
Simplesmente por ela dar massa a todas as outras. Por isso, o nome pegou.
Desde
antigamente, homens e mulheres se consagram à investigação dos mistérios da
natureza e vivem isso como uma busca espiritual. Muitos não pertencem, nem
aderem a nenhum credo específico. Mas, pensam que ao descobrir os meandros da
física e compreender melhor o funcionamento do universo, penetram ao menos um
pouco no próprio pensamento divino, ou seja, no modo como Deus concebeu sua
criação. Atualmente, na busca pelos segredos da natureza, muitos cientistas
desenvolvem uma dimensão espiritual. O próprio Einstein chamou isso de
"mistério cósmico profundo”. No mundo inteiro, fazem sucesso os livros de
Fritjof Capra, físico que liga ciência e espiritualidade holística.
Para
quem crê em Deus, quanto mais a ciência avança e se aprofunda nas descobertas
do mistério da vida humana e do universo, mais nos abrimos ao mistério que nos
envolve e nos revela a nossa vocação de amor e de cuidado. Nos anos 80, o filme
"Contatos imediatos do 3º grau” tinha em seu cartaz a afirmação: "Não
estamos sós!”.
O
físico e cientista brasileiro Marcelo Gleiser afirma não o contrário, mas algo
diverso: "Mesmo se a vida complexa existir no cosmo – e não podemos
afirmar que não exista– está tão distante daqui que, na prática, estamos sós e
temos a habilidade de pensar. Somos raros e preciosos. Somos como o universo
reflete sobre si mesmo. Portanto, (...) temos de adotar uma nova ética que nos
eleve acima da moralidade tribal que vem dominando a história da civilização
por milênios. Precisamos preservar a vida a todo custo, transformando-nos nos
guardiões desse mundo”.
Se
acreditamos que Deus é amor, não podemos aceitar que ele tenha ciúme da
humanidade e veja o progresso da ciência como concorrência com sua função de
criador. Isso seria ridículo. A inteligência humana que provoca o desenvolvimento
da ciência vem do Espírito Divino.
Diante
da afirmação da ciência de que o universo é infinito e em evolução cada vez
mais rápida, só podemos dizer como o salmo 19: "Os céus narram a glória de
Deus e o universo inteiro testemunha a obra de suas mãos”. Também o salmo 8
celebra a maravilha do universo e pergunta "Diante disso tudo, o que é o
ser humano, para que o trates com tanto carinho?”. E conclui com uma afirmação
que deve ser nossa atitude para com a ciência e todos os mistérios do cosmos:
cada pessoa tem a missão de ser como quem zela com amor e carinho por toda a
criação divina.
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